Hospedaria de Imigrantes

A Hospedaria de Imigrantes, prédio ainda existente, localizado na Rua Visconde de Parnaíba, 1316, bairro do Brás, na Cidade de São Paulo, hoje museu Memorial do Imigrante, foi um dos instrumentos de infraestrutura montada pelo Governo brasileiro para apoiar o fluxo imigratório que se desenvolveu a partir de 1875. Em nosso País havia também outro alojamento para esse fim, na cidade do Rio de Janeiro, denominado “Hospedaria dos Imigrantes Ilha das Flores”, na Ilha das Flores.

Pátio central da Hospedaria de Imigrantes

A chegada dos imigrantes promovida pelos governos do Brasil e da Itália realizava-se através dos Portos de Santos (SP) e na cidade do Rio de Janeiro. Os imigrantes com destino aos Estados do Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Espírito Santo e outros Estados eram reembarcados em navios menores pertencentes ao Governo brasileiro.

De forma organizada, podemos afirmar que foi em 1847 o ano da chegada dos primeiros imigrantes que chegaram ao Brasil, para trabalhar na lavoura do café. Foi o Senador Vergueiro quem promoveu essa primeira experiência, trouxe 80 famílias de alemães, cujo destino era a Fazenda Ibicaba, de sua propriedade, no município de Limeira (naquela época), em São Paulo. Hoje, após o desmembramento desse município, localiza-se no município de Cordeirópolis.

Esses primeiros colonos vieram para trabalhar em regime de parceria, desembarcando no Porto de Santos e seguindo de carroção e em lombos de mulas até a referida Fazenda. Pelas dificuldades que se pode imaginar que esses “pioneiros” passaram, sob todos os aspectos, e com a continuidade da chegada de novos imigrantes — lenta, porém constantes —, sentiram-se nossas autoridades a necessidade de apóiá-los no primeiro momento de sua chegada à nova terra.

Coube ao Governador Provincial Antônio de Queiroz Teles (Barão do Parnaíba) iniciar, em terreno, nas imediações da Estrada de Ferro São Paulo Railway, no bairro do Brás, a construção do prédio que veio a ser denominado “Hospedaria de Imigrantes”. O prédio foi projetado por Antônio Mateus Haussler, teve as obras iniciadas em 18 de maio de 1886 e terminadas em fins de 1888, construído em forma de “E”, em dois pavimentos com capacidade para abrigar 3.000 imigrantes, apesar de, em condições excepcionais, hospedar até 8.000 pessoas. Contava com gás encanado, reservatório de água, dois refeitórios com mesa para 800 pessoas, berçários, hospital, enfermaria, 3l banheiros com água fria e quente, sanitários com descargas automáticas, estufa para desinfetar roupas, agência de correios, posto policial e Agência Oficial de Colonização e Trabalho (responsável pelo encaminhamento das famílias para as Fazendas, no Interior do Estado), ramal ferroviário vindo do Porto de Santos e também ramal com destino ao Interior do Estado.

A Hospedaria de Imigrantes começou a funcionar em 19 de junho de 1887, precariamente, com um terço de suas instalações concluídas, sob a administração da “Sociedade Promotora da Imigração”, pois, com as epidemias de varíola e difteria no alojamento dos imigrantes do Bom Retiro, a saúde pública decidiu fechar o albergue. Com a Carta Constitucional do Estado de São Paulo, em 1892, a Secretaria de Agricultura, Viação e Obras Públicas assume a administração da Hospedaria de Imigrantes.


Fila de imigrantes para cadastramento na hospedaria

Ao chegar à hospedaria, vindo de trem do Porto de Santos, o imigrante tomava conhecimento do regulamento interno (escrito em seis idiomas) e recebia uma refeição. No dia seguinte, eram submetidos à vacinação, conferência e registro dos dados pessoais, não só do imigrante como dos seus familiares, para emissão da caderneta de identificação.

O regulamento da hospedaria, que passou por várias modificações, basicamente proporcionava aos imigrantes, além da infraestrutura predial, o transporte mencionado e o apoio, a saber:

1) hospedagens por um período máximo de 8 dias, com alojamentos para mulheres e homens solteiros e, ainda, para casais com crianças;

2) 4 refeições ao dia: café-da-manhã, almoço, jantar e café antes de dormir, que consistia de: pão, café, açúcar e leite; carne, feijão, arroz, batata, verdura; o pão com salame era o lanche para a viagem até o lugar de trabalho;

3) tratamentos médico e hospitalar;

4) serviços de agentes para facilitar a colocação nas fazendas de café;

5) intérpretes da “Agência Oficial de Colonização e Trabalho”, para facilitar as negociações com os novos patrões e na elaboração de contrato de trabalho que era transcrito na “Caderneta do Imigrante”.

Vista do dormitório masculino
Vista do dormitório feminino

O tratamento dado aos imigrantes quando da chegada deles ao Brasil, tanto na Hospedaria de Imigrantes, em São Paulo, como na Hospedaria da Ilha das Flores, no Rio de Janeiro, era considerado por eles como muito bom, o que pode ser comprovado através de relatos reais como daquele grupo de imigrantes da Província de Cremona, saídos da cidade de Torricella del Pizzo em 25 de outubro de 1886, que aportaram no Rio de janeiro e foram alojados na Hospedaria da Ilha da Flores, haja vista o transcrito no livro Grama Humana — A Grama do Senhor, de Remo Rômulo Farina, na página 151:

"Na hospedaria dos imigrantes, na Ilha das Flores, o casarão é acolhedor, registram-se constantes movimentações de pessoas e bagagens, elementos de origem e procedência diversas chegam atarantados em busca de acomodação: outros saem apressados, para reembarcar, cada qual com o seu projeto pessoal. Um avultado grupo que segue para as fazendas de São Paulo desocupa um laço do prédio, que nos é cedido pela administração. As instalações internas, iguais às coisas sovadas pelo uso continuado de gente do povo, carecem de algum reparo, mas, ainda sim, superam as da segunda linha do navio “Cinirio”, que nos aninhará, em seus porões, em condições muito precárias. O feijão preto com arroz entram em nossas vidas para ficar.

A alimentação, de modo geral, é boa, substanciosa, bastantes frutas e café. Claro, não há vinho, nem faz falta. A água é fresca, límpida, pura, uma benção do Céu, depois de tanta carência a bordo do navio “Cinirio” que nos trouxe da Itália. Limpeza, assistência sanitária, a todo momento. Como a vós somos gratos, Senhor!

Por mim, não sairia daqui, nunca. Os familiares pensam da mesma forma. Graças a essa bendita pausa reparadora, a restauração das forças físicas e psíquicas vai se completando auspiciosamente. Em poucos dias, a cor e o sorriso reaparecem no semblante. Stefano, Clemente e Giacomo, em modo especial, bem como os demais membros do clã, recobraram-se e continuam a se reabilitar, mostrando-se agora receptivos e alegres.

Talvez haja até um conteúdo de exagero nesse otimismo, após tantas privações sofridas."

Mas devemos lembrar que a saga do imigrante estava apenas começando. Se os dias na hospedaria pareciam um sonho, o pior estava por vir, quando da chegada no novo posto de trabalho nas fazendas de café, ou nas terras a serem colonizadas no Sul e em outras partes de nosso País.

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